

Martinho Patrício
Martinho Patrício, e pode ser uma máxima sintetizante do jogo ao qual ele se dedica em sua prática artística. Suas obras revelam um interesse pela criação de formas diversas a partir de materialidades similares – em especial o elemento têxtil, como linho, renda e cetim – que surge como corpo maleável e vivo. Embora essas peças possam remeter a símbolos ou vestimentas religiosas, seus desvios recusam interpretações unívocas.
Essa brincadeira entre o ser e o não ser reflete o fascínio do artista pelo cotidiano, convocando quem interage com sua prática a traçar um percurso próprio, que se desenha entre o sagrado e o profano. A partir da extração de pequenas formas repetitivas, suas obras sugerem conteúdos singulares, ainda que intrinsecamente conectados aos territórios vistos e percorridos por Martinho.
Entre suas referências estão artistas como Hélio Oiticica, Lygia Clark e Rubem Valentim, pilares da geometria brasileira. Apesar das diferenças, as obras desses artistas dialogam com a ideia de arte como experiência – sensorial, espiritual ou cultural –, convidando o público a novas formas de percepção. Oiticica e Clark enfatizam a relação entre corpo e participação, enquanto Valentim desenvolveu uma poética visual que resgata símbolos afro-brasileiros, propondo uma imersão mística e uma valorização dos legados culturais africanos e da diáspora no Brasil.
Martinho Patrício compreende seu trabalho como parte de um pensamento que dialoga com a produção brasileira destacada a partir dos anos 1950, mas que se ancora nas ruas como principal agência criativa. Em sua prática, o artista utiliza diversos suportes – fotografia, desenho, instalação – e se refere também ao teatro como parte de sua pesquisa.
Na tradição brasileira, o clown (ou palhaço) não é apenas um personagem, mas uma persona que emerge do intérprete, refletindo aspectos únicos de sua personalidade. Essa figura se constrói a partir da escuta, do jogo, da interação com o público e de uma sinceridade desarmada, que revela tanto o ridículo quanto a beleza. Com mais de 20 anos de atuação como clown, Martinho explora a comicidade como um campo vibrante, onde gestos e olhares tornam-se possibilidades de pequenas cenas. O palhaço age como um trickster, atento ao momento, conduzindo o tempo sem dominá-lo, descobrindo no ato aquilo que não se sabe, subvertendo códigos.
O desenvolvimento desta prática, daquele que brinca, que utiliza da ironia e do humor enquanto ferramenta de vida e trabalho também está presente na obra de Martinho, não em seu método de execução – marcados por detalhismo e refinamento –, mas na forma como ele vê o mundo, anterior à materialização dos trabalhos, mas inerente a eles.
Texto: Ariana Nuala