Martinho Patrício

Frequência

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  • Data

    21/11/24 14/02/25

  • Artista

    Martinho Patrício

  • Curadoria

    Ariana Nuala

Martinho Patrício, e pode ser uma máxima sintetizante do jogo ao qual ele se dedica em sua prática artística. Suas obras revelam um interesse pela criação de formas diversas a partir de materialidades similares – em especial o elemento têxtil, como linho, renda e cetim – que surge como corpo maleável e vivo. Embora essas peças possam remeter a símbolos ou vestimentas religiosas, seus desvios recusam interpretações unívocas.

Essa brincadeira entre o ser e o não ser reflete o fascínio do artista pelo cotidiano, convocando quem interage com sua prática a traçar um percurso próprio, que se desenha entre o sagrado e o profano. A partir da extração de pequenas formas repetitivas, suas obras sugerem conteúdos singulares, ainda que intrinsecamente conectados aos territórios vistos e percorridos por Martinho.

Entre suas referências estão artistas como Hélio Oiticica, Lygia Clark e Rubem Valentim, pilares da geometria brasileira. Apesar das diferenças, as obras desses artistas dialogam com a ideia de arte como experiência – sensorial, espiritual ou cultural –, convidando o público a novas formas de percepção. Oiticica e Clark enfatizam a relação entre corpo e participação, enquanto Valentim desenvolveu uma poética visual que resgata símbolos afro-brasileiros, propondo uma imersão mística e uma valorização dos legados culturais africanos e da diáspora no Brasil.

Martinho Patrício compreende seu trabalho como parte de um pensamento que dialoga com a produção brasileira destacada a partir dos anos 1950, mas que se ancora nas ruas como principal agência criativa. Em sua prática, o artista utiliza diversos suportes – fotografia, desenho, instalação – e se refere também ao teatro como parte de sua pesquisa.

Convido então a fazermos uma leitura com o trabalho deste artista paraibano – uma das milhares possíveis – a partir do teatro de rua, reconhecendo os marcadores da história da arte brasileira, mas deslocando um pouco este pilar numa constituição única da trajetória deste artista.

Na tradição brasileira, o clown (ou palhaço) não é apenas um personagem, mas uma persona que emerge do intérprete, refletindo aspectos únicos de sua personalidade. Essa figura se constrói a partir da escuta, do jogo, da interação com o público e de uma sinceridade desarmada, que revela tanto o ridículo quanto a beleza. Com mais de 20 anos de atuação como clown, Martinho explora a comicidade como um campo vibrante, onde gestos e olhares tornam-se possibilidades de pequenas cenas. O palhaço age como um trickster, atento ao momento, conduzindo o tempo sem dominá-lo, descobrindo no ato aquilo que não se sabe, subvertendo códigos.

O desenvolvimento desta prática, daquele que brinca, que utiliza da ironia e do humor enquanto ferramenta de vida e trabalho também está presente na obra de Martinho, não em seu método de execução – marcados por detalhismo e refinamento –, mas na forma como ele vê o mundo, anterior à materialização dos trabalhos, mas inerente a eles.

Na exposição Frequência, Martinho Patrício nos conduz por um campo vibrante, onde tecidos, cores e texturas se entrelaçam, criando paisagens de tempos distintos que reverberam entre si. A mostra expõe peças que criam uma espiral na caminhada do artista, sem a pretensão de se fazer como um panorama, mas sim, como um espaço laboratório, de experimento, uma formação de montagem nova que cria um jogo ainda não visto, e que pode ser experienciado. Peças recentes, como Catiço (2023) e Grêmio Recreativo (2023) estão presentes – este último que se remete a seu primeiro trabalho As Entradas (1990), que não compõe a exposição – assim como desdobramentos de seu trabalho com diferentes tecidos desenvolvidos em Cardeais (1996), Rubi (2023) e Guias (2023).

É um gesto de repetição e desvio, de continuidade que respira e não se fixa. Como um murmúrio constante, a obra encontra encruzilhadas e assume outros ritmos e formas, uma exposição/palco. O tecido não é apenas suporte, mas matéria que guarda memória e transmite vibrações. As obras se tornam figuras, presenças que se apresentam em suas propriedades térmicas e luminosas.

Na física clássica, as cores vermelho, preto e branco podem ser interpretadas em relação à ideia de frequência dentro do espectro eletromagnético, principalmente no contexto da luz visível e suas propriedades. O vermelho é associado a comprimentos de onda mais longos e frequências mais baixas no espectro visível, já o preto não é uma cor com frequência no espectro visível; ele resulta da ausência de luz visivel refletida ou absorção completa de todas as frequências. O branco, ao contrário, é a soma de todas as frequências de luz visível refletidas ou emitidas simultaneamente, criando uma percepção de luz total.

As cores – vermelho, branco e preto – pontuam a exposição como pulsos. O vermelho, denso e visceral, o branco, síntese de todas as frequências, flui como um intervalo luminoso e o preto é mistério, espaço de potencialidades. Essas cores vibram em camadas sensoriais que ecoam no corpo através de um banho de luz;  são atores que profanam a sacralidade posta sobre eles mesmos.

Texto: Ariana Nuala

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