Marlan Cotrim faz sua primeira individual no Recife

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A Galeria Amparo 60 abre, na quinta-feira (27), às 19h, a exposição C, da Marlan Cotrim, com curadoria de Ariana Nuala. A artista, natural de Goiânia, radicada no Recife, apresenta sua primeira individual na cidade com a exibição de 13 trabalhos.

A mostra parte do mergulho da artista em uma nova pesquisa, iniciada em 2024 e que tomou corpo neste ano, na qual utiliza cloro e carvão em tecido de algodão. Essa investigação marca um novo momento no desenvolvimento do trabalho da Marlan, que deixa a tela e passa a trabalhar diretamente com o tecido. “Quando ela começa a juntar tecido preto, cloro e carvão, aparece um tipo de imagem que não vem da pintura tradicional, vem da reação, daquilo que se desfaz e reaparece”, pontua Ariana Nuala.

Segundo a artista, esses materiais chegam juntamente com as primeiras sementes da pesquisa, perguntas sobre processos de apagamento e sobre como inscrever sobre eles. “O cloro veio como lembrança das lavanderias de tecido. Se usa muito cloro para branquear tecidos. Algo que está ligado a diversas violências desde o século XVIII com os processos de alvejar algodão massivamente, poluição de rios, até a relação do uso do carvão mineral como combustível fóssil, acelerando a indústria, a queima e emissão de carbono na atmosfera. O carvão vem como essa matéria cheia de memória que  inscreve sobre o apagamento. Devolvendo cor e vingando o algodão de processos anteriores”, detalha Marlan.

Nesse processo, a artista encontrou o conceito de modelo ideal de corpo negro na física. O cloro vai em direção ao branco, o carvão vai em direção a todas as outras cores, já que ele pode ser considerado um tipo aproximado do modelo ideal de corpo negro físico. “Marlan passa a trabalhar com esse corpo que absorve toda a radiação e só devolve luz conforme a temperatura e coloca isso em diálogo com o corpo negro como construção histórica e política. O cloro tem uma história pesada: foi usado para branquear tecido, para impor um padrão de limpeza e pureza que vem junto com colonialismo, higienismo e controle. Na obra dela, esse alvejamento não é limpeza, e sim, fricção. É revelar o que foi apagado”, diz Ariana. O carvão chega como uma matéria negra que não traz apagamento, mas sim potência, que aquece, absorve, reemite. A tensão entre o cloro e carvão, a brancura e calor, abre camadas raciais, históricas e materiais.

Marlan Cotrim começou sua trajetória na dança, aos 9 anos, e o movimento segue sendo algo central na sua produção. Nas suas telas, tremores, desequilíbrios, rastros e borrões vão se apresentando como resultado de um corpo que treme antes de ser traço. Corpografias em trânsito, série em pintura a óleo, já registrava o traço do tremor das travessias, das formas que borram e das qualidades de criar horizontes que se formam e deformam… “Levo essa coreografia para as telas em cloro e carvão, mas aqui esse traço toma outra densidade é como pintar em infravermelho. No cloro é por subtração da cor, é processo de oxidação do pigmento preto do tecido de algodão e isso gera um rasgo visual químico do pigmento”, comenta Marlan.

Para a curadora, o gesto da artista é muito corporal, ela não aplica o cloro de forma técnica, mas com curvas, tremores, um movimento quase dançado, como se o corpo escrevesse a imagem por desvio. “Nos mantos de cerâmica isso fica ainda mais claro: a forma muda conforme o público encosta, move, reorganiza. A obra depende do corpo do outro para existir. Então dança e coreografia não são temas, são modos de fazer”, detalha a curadora falando sobre as esculturas maleáveis  que também compõem a exposição.

Essas obras são formadas por mantos de cerâmica queimada em alta temperatura unidos por fios de algodão, são esculturas que não tem sua forma estabelecida. O público é convidado a  acionar sua forma, tocar, sentir o peso, ouvir os sons que o esbarrar dos pedaços faz, “é uma escultura que acorda o corpo e tem seu corpo acordado também”, diz Marlan.

“Os mantos cerâmicos pensam o contrário do monumento. Em vez daquela coisa dura, fixa, heroica, ela cria peças que se mexem, se dobram, se articulam. É barro, temperatura, cordões de algodão, tudo junto. Uma escultura que não se fecha: cada toque muda o desenho, cada gesto cria outro som, outra temperatura. Ela funciona como um anti-monumento mesmo: feito para ser ativado, não para ser venerado. É sobre instabilidade, sobre se manter em movimento”, complementa Ariana.

O nome da mostra, que segue em cartaz até 23 de janeiro, surgiu a partir da percepção da artista e da curadora da repetição da letra C como marcador da pesquisa: cloro, carvão, calor, cor, corpo e combustão, tornando-se impossível o desvio deste arco formado por essa letra.

Fonte: Revista Continente

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